Descrição da imagem para deficientes visuais: placa da cidade do Rio de Janeiro azul com o rodapé branco. Está escrito: Rua Abrahão Jabour. 1884-1980. Criador da Cidade dos Velhinhos. 22783-135. Recreio dos Bandeirantes.
Num certo dia um motorista ao me conduzir
ao endereço combinado o fez com o auxílio de um GPS. Então, fui prestando
atenção nos nomes das ruas que o aplicativo ia falando. Chamou-me a atenção o
fato de não ter ouvido nenhum nome de mulher nas ruas anunciadas.
Espantada com o óbvio travei um pequeno
diálogo com o motorista:
- O senhor costuma ouvir nomes de
mulheres nas ruas e praças nos trajetos que faz?
- A senhora sabe que nunca parei para
pensar sobre isso! Mas agora, pensando bem, acho que não. Mas, por que a
pergunta?
- Talvez porque seja feminista. De
repente me veio esse questionamento.
Na privacidade das minhas reflexões
fiquei a lembrar dos nomes das ruas no bairro onde moro e nos vizinhos. Inacreditavelmente
não recordei nenhuma rua com nome de mulher. Chegando em casa fui pesquisar e
confirmei a inexistência de qualquer homenagem a uma personagem mulher
traduzida em uma placa de rua no entorno da minha residência.
Detectei algumas poucas em outras
localidades. Nossa, uma migalhice comparando-se as homenagens concedidas aos
homens. De longe podemos entender essa constatação como algo banal. Ao
contrário, as mulheres precisam estar mais unidas para que o movimento
feminista tome corpo. Vale dizer que necessitamos estar mais nas ruas. Ocupar,
de verdade, os espaços públicos e privados que também são nossos por humanidade
e competência.
Claro que essa observação deve-se ao
patriarcado que nos assola desde sempre. É que o homem reduziu a mulher a uma
coisa dando-lhe um significado puramente material. Verdadeiramente a mulher
ainda é vista como um ser insignificante, secundário. A lógica é que, como uma
coisa, não pode ser alçada a um personagem capaz de receber uma homenagem
revelada num nome de rua, monumento, praça, etc. Incontestável é que a
exceção serve para confirmar a regra de
que a igualdade de gênero ainda é incipiente.
Para o pensador grego Aristóteles os
homens eram seres pensantes, pelo que decidiam avida na pólis. Iam às ruas
fazer política. Já as mulheres eram seres secundários, não pensantes, razão
porque tinham os seus lugares da porta para dentro, melhor dizendo, confinadas
nos lares. Por não serem essenciais é que serviam para procriar e criar os
filhos, bem como cuidar dos escravos e animais.
Lamentavelmente essa ideia ainda está
entre nós em 2016, pelo que carecemos refletir, conversar sobre esse sutil
detalhe. Faz pouco tempo que a grande mídia noticiou uma matéria dando ênfase a
uma mulher de "sorte", anunciando-a como bela, recatada e do lar. Por
estarmos mais zelosas e reflexivas foi que demos o troco nas redes sociais com
muita veemência, de modo a abominar e rechaçar os predicados enfatizados na
machista notícia.
Notadamente não queremos mais estar
confinadas nos domicílios, tampouco nos importa a beleza, o recato e o
abominável título de a rainha do lar. Hoje queremos ser vistas e julgadas pela
nossa competência em todas as áreas do conhecimento. Isso sim!
A partir destas ponderações, se faz
prudente pensar: e as mulheres com deficiência? Representando esse seguimento
afirmo que não encontrei qualquer placa de rua homenageando uma mulher com
deficiência.
Claro que temos muitas de nós que lutaram
bravamente, por exemplo, pela aprovação da Convenção sobre os Direitos das
Pessoas com Deficiência, a fim de que tivesse status de Emenda Constitucional e
tiveram sucesso nessa empreitada desgastante. Por que não estão homenageadas
nas ruas? Existem muitas outras que se destacaram na nossa luta pela igualdade
e que estão no esquecimento nessa nossa sociedade tão preconceituosa. Notório
que as mulheres com deficiência ainda estão em fase gestacional. Precisamos
nascer!
Tenho participado de muitas conversas em
praças públicas na RJ e, com segurança, digo que tenho sido a única mulher com
deficiência. Sempre peço a palavra e, ao usar o microfone, faço essa checagem.
Pena mesmo!
Gritar, demandar, reclamar e estar nas
ruas é o que temos a fazer, a fim de conquistar o nosso lugar dentro do
movimento feminista.
SORORIDADE é a palavra mágica da
hora. Mulheres com e sem deficiência precisam se unir para o fortalecimento do
direito de igualdade de gênero. Mas, como conseguir essa visibilidade?
Indubitavelmente a resposta está nos
valores e princípios éticos. O que as mulheres estão fazendo umas com as
outras? Nítido que essa convivência vai muito mal! Tanto é assim que não somos
chamadas para as rodas de conversas sobre as pautas de nosso interesse.
As mulheres sem deficiência precisam
encontrar a si próprias para que enxerguem as mulheres com deficiência como
iguais. Estas têm que reconhecer que não somos quase alguém. Somos sim mulheres
de direito e obrigações tanto quanto elas. Daí, ficará fácil encontrarem à
alteridade.
Creio que a pior cega é a que não quer
ver, não é mesmo?
Pensar, pensar, pensar...